segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Emanações


Tosse... tosse...
Do meu lado alguém se contorce.
Gritos de dor na sala do lado.
Alguém discute
O melhor jeito...

PROXIMO!!!

Alguém chama
E a fila anda parada.
Bocejos, sussurros
O cara ao lado xinga pra dentro:
mmmm... pi... pi...!
Estou incomodada,
O sol bate em minha barriga.
Estendida na cadeira,
Analiso mosaicos
E não consigo montá-los

PROXIMO!!!

A fila continua andando
E continua parada.
Uma mão borboleta
Pousa em meu ombro.
Indizível paz naquele toque...
Fecho os olhos e apascento
O rebanho hostil em mim.

PROXIMO!!!

Priiiiiiimmm, priiiiiiimmm!
Telefone chato acima das vozes
Responde a outro ao fundo.
As vezes penso em sair correndo
E abandonar tudo...
Mas o enfrentamento
Faz parte de minhas limitações
E abandoná-lo é contravenção

PROXIMO!!!

Ninguém se manifesta.
O corredor se cala.
O telefone se cala.
O xingamento se cala
Uma letargia estranha me arrefece:
Meu corpo se cala
E bebo a sensação do desmaio
Como se fora néctar:
Minha cabeça
Pende para a esquerda...

PROXIMO!!!

Ouço na distância bem distante
E ainda sinto a mão
Arrebanhando minhas angústias.
Paradoxo:
Dedos longos, ossudos
Afagando... resgatando.
E aquela luz dissonante
Doendo gostoso na alma.

SILÊNCIO!

Como no trabalho suicida
Do bicho-da-seda.

SILÊNCIO!

De cavalos marinhos
Em seu cavalgar líquido.

SILÊNCIO!

Como a aurora rompendo
E o crepúsculo se impondo.
E é neste silêncio
Que o mundo se algazarra,
Galga suas ondas
E se espalha na lâmina cega
Desta vida gótica.

SILÊNCIO!

A mão apaziguadora toca meus dedos
E o choro se arrebenta da barriga,
Além do alarido do mundo.
Primeiro choro de muitos!
Campo de trigo ladeado
Por árvores colossais.
Cachoeira imberbe
Que terá toda uma vida
Para desaguar no mar.

O mar te espera,
Doce rebento!
E o sal há de temperar-te
Ou desidratar tua alma!
Mas vá! Segue teu curso...
Te expandas...
Convertas teu cajado
Em teu remo inseparável...
Em bastião inexpugnável.
Vá... simplesmente...
Que a gravidade do mundo
Fará todo o resto.
Como sempre fez...

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